- Reflexão teórica sobre as discussões propostas por Levy e Castells sobre o ciberespaço e emergência de um novo tipo de sociedade na contemporaneidade. Por: Emília Souza Carvalho
Os autores Manuel Castells e
Lévy Pierre são grandes expoentes no campo de
estudos da mídia cibernética, da compreensão dos
fenômenos de comunicação e produção de informação e conhecimento. Fazem uma abordagem sobre o ciberespaço de forma que percebamos
a influência da tecnologia em nossa sociedade contemporânea,
Ambos os
autores, traçam suas percepções sobre o crescimento do ciberespaço, novo meio
de comunicação que surge da interconexão de computadores e o consequente
surgimento da cibercultura. Conforme destaca Levy
“a cibercultura expressa o surgimento de um novo universal, diferente das
formas que vieram antes dele no sentido de que ele se constrói sobre a
indeterminação de um sentido global qualquer” (1999).
O ciberespaço de
acordo com Levy tem sido um territorio fértil e indispensável na maioria das
atuais áreas de trabalho, pois a técnica já se constitui como um elemento
essencial na construção de conhecimentos e relacionamentos que vêm mudando
completamente a maneira das pessoas pensarem, de se comunicarem, de conviverem
umas com as outras e com o mundo, “considera que a
cibercultura é uma nova forma de produção de sentidos, a partir do uso das
técnicas”, pois é um territorio de construção de significados e
ressignificados.
Com o advento da internet de maneira
geral funda-se o novo momento histórico em que a base de todas as relações se
estabelece através da informação e da sua capacidade de processamento e de
geração de conhecimentos. Assim, o ciberespaço é percebido como um fato concreto na
contemporaneidade, onde se torna possível aprender e ensinar a partir dele, ou
seja, a interação entre os usuários desse espaço é capaz de fazer com que eles
não só adquiram conhecimentos, como também compartilhem esses conhecimentos. A este fato Castells (1999) denomina
“sociedade em rede”, que tem ícone da revoluçaõ, a apropriação da Internet com
seus usos e aspectos incorporados pelo sistema capitalista.
Embora a linha de análise dos autores abordados
siga caminhos diferentes, sendo Castells com uma abordagem marxista da
sociedade capitalista e Lévy com um pensamento antropológico, Lévy (1998)
utiliza a mesma analogia da “rede” para indicar a formação de uma “inteligência
coletiva”, ao explicar o virtual, a cultura cibernética, em que as pessoas
experienciam uma nova relação espaço-tempo. Neste
sentido, estaríamos passando por um processo de universalização da
cibercultura, na medida em que estamos dia-a-dia mais imersos nas novas
relações de comunicação e produção de conhecimento que ela nos oferece.
Desta forma, a sedimentação social da Internet é a
base da sociedade em rede, conforme indica Castells:
Ela
originou-se e difundiu-se, não por acaso, em um período histórico da
reestruturação global do capitalismo, para o qual foi uma ferramenta básica.
Portanto, a nova sociedade emergente desse processo de transformação é
capitalista e também informacional, embora apresente variação histórica
considerável nos diferentes países, conforme sua história, cultura,
instituições e relação específica com o capitalismo global e a tecnologia
informacional. (CASTELLS, 1999, p.50).
Diante
da
difusão de tanta informação podemos dizer que estamos vivenciando
a “era da informação”, pois, de maneira geral, constitui o novo momento
histórico onde a base das relações se estabelece através desta informação e de
sua capacidade de processamento e de geração de conhecimentos.
A
Internet passa a ser compreendida como uma rede que congrega diversos grupos de
redes. E essas redes não são apenas de computadores, mas também de pessoas e de
informação.
Dentro
da mesma lógica da rede, essa corporação forma uma nova cultura que Lévy
denomina de cultura do ciberespaço, ou “cibercultura”:
O ciberespaço (que também chamarei de “rede”) é o novo meio de
comunicação que surge da interconexão mundial dos computadores. O termo
especifica não apenas a infra-estrutura material da comunicação digital, mas
também o universo oceânico de informações que ela abriga, assim como os seres humanos
que navegam e alimentam esse universo. Quanto ao neologismo “cibercultura”,
especifica aqui o conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas,
de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente
com o crescimento do ciberespaço. (LÉVY, 1999, p.17).
O
fato é que a partir da década de 70, a informação e o conhecimento adquirem uma
nova projeção social e econômica, na medida em que dentro de uma lógica de
geração, processamento e transmissão da informação, as inovações e o
conhecimento são a marca da sociedade contemporânea. É nesse espaço da cultura
comunitária que as pessoas adquirem experiências das potencialidades do meio,
em termos de percepção e de interação. O
ciberespaço amplifica, exterioriza e modifica funções cognitivas humanas como o
raciocínio, a memória e a imaginação.
Pierre Lévy em suas conjecturas acerca da nova relação que o Homem
estabelece com o saber, agora que está imerso na cibercultura.
O que é preciso aprender não pode mais ser planejado nem precisamente
definido com antecedência. [...] Devemos construir novos modelos do espaço dos
conhecimentos. No lugar de representação em escalas lineares e paralelas, em
pirâmides estruturadas em ‘níveis’, organizadas pela noção de pré-requisitos e
convergindo para saberes ‘superiores’, a partir de agora devemos preferir a
imagem em espaços de conhecimentos emergentes, abertos, contínuos, em fluxo,
não lineares, se reorganizando de acordo com os objetivos ou os contextos, nos
quais cada um ocupa posição singular e evolutiva (LÉVY, 1999, p. 158).
Neste sentido, o autor confronta a organização do sistema educacional e
o papel do professor. Ambos devem levar em conta o crescimento do ciberespaço e
o avanço da cibercultura. Para atender as demandas da atualidade o professor deverá
deixa o papel historicamente construído de centralizador do conhecimento para
se tornar um incentivador da inteligência coletiva, uma vez que o caminho que a
internet nos sugere é sem volta, portanto, precisa ser compreendido, embora a cibercultura
ainda não seja uma verdade universal.
De acordo com Rui Fava, autor da obra Educação 3.0, “os estudantes não
são os mesmos para os quais o sistema educacional atual e, principalmente, as
metodologias de ensino aprendizagem foram criadas”
(2014). Os estudantes dos anos e décadas anteriores eram indivíduos isolados, enquanto
os novos estudantes, mesmo dentro de um ambiente virtual, são mais conectados
socialmente.
Nesta mesma perspectiva, JARAUTA e
IMBERNÒN no capítulo: A escola contínua e
o trabalho no espaço-tempo eletrônico, da obra Pensando no Futuro da Educação: Uma Nova Escola para o Século XXII,
afirma em suas reflexões que é certa a existência de escolas no século XXII e,
de forma decisiva, estabelecem que as instituições de ensino passarão por
profundas transformações, embora as necessidades de seu público continuem as
mesmas: educar-se e socializar-se. Essas transformações dar-se-ão, segundo os
autores, até mesmo na estrutura organizativa da educação, com a nova realidade
de espaço e de tempo que já se nos apresenta na aprendizagem promovida em
ambientes eletrônicos.
Os autores lançam mão do conceito
de tecnoescolas, ou e-escolas, que têm sua atuação baseada no uso das
tecnologias de informação e comunicação (TICs). As e-escolas são apresentadas
como uma necessidade da sociedade pós-industrial e seriam a nova forma de
oferecer e organizar a educação no século XXII.
Em relação ao futuro JARAUTA e
IMBERNÒN afirmam que:
“
a escola do futuro não formará pessoas para trabalhar nas industrias, salvo uma
parte, mas sim em setores relacionados à informação e ao conhecimento, isso
porque também o trabalho será realizado cada vez mais no terceiro setor, como
vem ocorrendo nas ultimas décadas”. (JARAUTA, 2015)
Em resumo, afirmam que “as atuais sociedades
da informação emergiram e estão se desenvolvendo em um novo espaço-tempo social,
o terceiro entorno” (2015). No “terceiro entorno”, ou espaço digital, não
haverá amarras espaço-temporais, mas sim objetivos de aprendizagem
preestabelecidos. As escolas trabalhariam em rede e ofereceriam formação
contínua, sem idades preestabelecidas para acesso, rompendo a lógica
industrial. Qualquer um poderia aprender onde e quando quisesse ao longo de
toda a vida. Considera ainda a possibilidade de inclusão do lúdico na
aprendizagem, o que, segundo ele, é um caminho ainda não muito explorado nos
processos de e-learning.
No
que diz respeito à informação, percebe-se que este foi o mais rápido período de
transformação tecnológica que o mundo vivenciou. Em contraste, num período de
poucas décadas, ocorreu a invenção e adoção das tecnologias digitais por mais
de um bilhão de pessoas no mundo todo.
Conforme
destaca Rui Fava:
“Apesar da enorme
utilização de tecnologias nenhum geração ainda viveu toda uma vida na era digital.
Isso faz com que tenhamos que buscar novos paradigmas, novos modelos mentais,
novos hábitos e, para isso, alguém tem que ceder e certamente esse alguém são
os emigrantes digitais. Não há dúvidas de que os nativos digitais irão mover os
mercados, transformar as indústrias e modificar a educação. Estas mudanças
poderão ter um efeito imensamente positivo no mundo em que vivemos. A chegada
da tecnologia digital já tornou este mundo um lugar melhor de se viver e, se
deixarmos, os nativos digitais têm todo o potencial e a capacidade para
impulsionar muito mais a sociedade. (RUI FAVA, 2012, p. 13).
A vida
contemporânea passa a ser definida pelas novas sociabilidades e relações com o tempo
e o espaço. Teremos à frente novos mecanismos de interação e de composição de
uma identidade própria e múltipla, formação de grupos ou tribos, um novo
espaço-tempo a ser experienciado, em que o espaço físico é praticamente
eliminado e o tempo acelerado. Nessa
perspectiva, o que amplia as possibilidades de construção da inteligência
coletiva é o fato de os usuários da rede e seus grupos poderem compartilhar,
negociar e refinar modelos mentais comuns.
As
transformações advindas das tecnologias educacionais demandam novas
metodologias de ensino, que contam com modernos suportes pedagógicos, capazes
de criar um novo papel para o professor e ressignificar o conceito de ensino. Do
mesmo modo, as novas exigências da sociedade atual levam as instituições de
formação do professor a se reposicionar, para atender às diferentes metodologias,
ao exercício da pesquisa no cotidiano da prática pedagógica, com respeito aos
distintos saberes dos alunos.
Desta
forma uma das metas da contemporaneidade é a de incluir todo o mundo no “mundo
digital”, pois, em questão as novas tecnologias a situação do usufruto das informações
ainda persiste, portanto existe uma proposta de estratégia globalizadora, ou seja,
todos devem ter acesso a toda informação e conhecimento que já circulam na
Internet. Incluir os “marginalizados” nos benefícios que a economia mundial
proporciona à informação.
REFERÊNCIAS:
CASTELLS, Manuel.
Redes de indignação e esperança:
Movimentos sociais na era da internet; Tradução Carlos Alberto Medeiros, 1.ed.
Rio de Janeiro: Zahar; 2013.
CASTELLS, Manuel. A sociedade em rede. 7º ed, São Paulo:
Editora Paz e Terra, 2003-a.
FAVA, Rui. Educação 3.0: como ensinar estudantes
com culturas tão diferentes. 2. ed./ Rui Fava. Cuiabá: Carlini e Caniato
Editorial, 2012.
LÉVY, Pierre. Cibercultura.
São Paulo: Editora 34, 1999.
___________. Inteligência
coletiva: para uma antropologia do ciberespaço. São Paulo: Loyola, 2007.
______. A inteligência coletiva. São Paulo:
Edições Loyola, 1998;
JARAUTA, Beatriz;
IMBERNÓN, Francisco (Orgs.). Pensando no futuro da educação: uma
nova escola para o século XXII. Tradução de Juliana dos Santos Padilha. Porto
Alegre: Penso, 2015.
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