Desde que a escola esteja equipada com espaços diferenciados, como biblioteca, laboratórios de ciências e de informática e oficinas de arte, é possível instituir uma nova dinâmica com a otimização desses espaços. Um primeiro problema está em que muitas vezes tais espaços não são vistos como prioridade. É inconcebível que uma escola funcione sem uma biblioteca ou mesmo que a biblioteca seja tratada como mero depósito de livros imprestáveis, em geral edições antigas de velhos livros didáticos. O desenvolvimento de hábitos de leitura e investigação bibliográfica é fundamental para a formação do jovem estudante de Ensino Médio, que quase sempre não tem acesso ao livro no ambiente familiar.
Sem que se precise abandonar a sala, a hierarquização, a rigidez e a repetição são quebradas mediante a instituição de uma nova dinâmica de organização interna do espaço, transferindo-se para ele acervos dispersos pela escola e, às vezes, mal utilizados. Livros, vídeos, mapas, laboratórios ou kits móveis de ciências e até computadores podem equipar as salas atendendo às especificidades de cada área específica de conhecimento. Em muitas escolas, são os alunos que se movem de uma sala a outra, ao invés de permanecerem passivamente aguardando o professor em um ambiente desprovido de atrativos e recursos para aprendizagens às vezes tão diferenciadas. O habitual é que o padrão de sala pobre de recursos acabe resultando em aulas igualmente pobres de recursos.
Embora se possa fazer muita coisa nova e boa mesmo dentro das velhas estruturas, a adoção do princípio da flexibilidade na organização curricular pede um pouco mais de ambição, criatividade e ousadia no uso do tempo. E isso por diversas razões. Primeiro, porque nada assegura que sejam necessárias unidades de quarenta ou cinqüenta minutos para que a aprendizagem se dê. Ainda esta vez, é preciso superar a repetição. Dependendo do que esteja ocorrendo no processo de aprendizagem, cinqüenta minutos podem significar muito, mas também podem significar pouco. Isto porque a concepção de aprendizagem com que estamos lidando não é mais aquela da simples transmissão e reprodução de informações. Para o sucesso da concepção "bancária" bastava cortar o conhecimento em pequenas fatias e distribuí-las ao longo das diversas horas de cinqüenta minutos. O que importava era a quantidade de informação, não a qualidade da formação. Se o que queremos é que o educando construa competências e conhecimentos significativos para sua vida social e se reconhecemos que a complexidade da vida social exige, por coerência, uma aprendizagem também complexa, não podemos abandonar a perspectiva de adotar novas práticas pedagógicas, como, por exemplo, o trabalho por projetos, que exige um planejamento flexível e não linear.
Não é curioso como muitas escolas desenvolvem ricas experiências de "semanas da escola", "semanas de ciências" ou "semanas culturais", durante as quais as amarras do cotidiano são rompidas e alunos e professores podem interagir livremente no desenvolvimento de atividades variadas e interessantíssimas para todos? Não é curioso que tanto professores como alunos dêem depoimentos bastante entusiasmados dos resultados que obtiveram, do quanto aprenderam e de como foi prazeroso aprender dessa forma? Pois é, mais curioso ainda é que isso aconteça uma única vez por ano e na semana seguinte tudo volte a ser a mesma chatice incômoda de sempre. Se as escolas dão seguidas provas de que é possível fazer isso às vezes, por que não fazê-lo mais vezes? Sem falar da incoerência simbólica de se querer circunscrever a ciência ou a cultura a uma única semana. Para que, então, servem as outras semanas?
Claro que ninguém está pedindo para transformar o cotidiano da escola num verdadeiro caos que não se possa administrar. A mudança requer um planejamento e que este seja flexível para prever a possibilidade de se romper com a prática rotineira quando isto se fizer necessário, para o bem da aprendizagem dos alunos. Mas, para que isto ocorra, será preciso reinventar o ambiente e o trabalho escolar, deixando de lado para sempre a estagnação e o conservadorismo.
NOTAS:
* Professor Assistente de História da Música da Uni-Rio; ex-Professor do Colégio Pedro II e ex-Coordenador-Geral de Ensino Médio da Semtec/MEC.
1. FRANÇA, Lilian Cristina Monteiro. Caos - Espaço - Educação. São Paulo: Annablume, 1994, p. 13-4.
2. Idem, p. 57.
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